(De: Saúde mental na pandemia – 56)
Debates recorrentes a respeito desta síndrome nos chamam a atenção. Segundo reportagem recente de um jornal carioca, 78% dos profissionais de saúde estão acometidos do mal neste momento.
É um número estranhamente preciso e tremendamente alto…
A Síndrome de Burnout foi descrita nos anos 70 e se refere a um conjunto de sinais e sintomas de stress, mas com uma especificidade: se origina e diz respeito ao ambiente de trabalho.
Também conhecida como “Síndrome do esgotamento profissional”, se manifesta especialmente em pessoas cujas profissões ou ocupações envolvem contato direto e intenso com situações e realidades desgastantes- profissionais da área de saúde, educação, segurança, assistência à populações vulneráveis, etc.
É também observada em ambientes corporativos onde há vivências de abuso e assédio emocional de chefes sobre subordinados ou entre colegas (como o bullying em colégios). E o indivíduo pode entrar em colapso físico e/ou mental.
Os efeitos são basicamente os mesmos do stress propriamente dito, porém surgem em decorrência de condições de trabalho adversas ou emergenciais onde há muita pressão e graves dificuldades.
Surgem sintomas como: depressão, esgotamento, ansiedade, dificuldade de concentração, irritabilidade, alterações de humor, dores musculares. É uma lista extensa e variada que podemos entender como semelhante a um stress em alto grau.
Existem ocupações onde há muita pressão rotineiramente: na saúde, educação, brigadas de incêndio, polícia.
São exigências inerentes ao dia a dia onde este é o padrão e fazem parte da natureza do próprio trabalho: equipes de resgate, atendimento em locais de conflito, após catástrofe natural ou ambiental, etc.
É sabido que entre os profissionais de saúde, o trabalho do médico anestesista e de grupos de atendimento de emergência demandam respostas muito rápidas, nível de atenção constante e alta responsabilidade.
São profissionais mais sujeitos ao esgotamento pela própria dinâmica de sua atividade, portanto precisam de mais auto cuidado e regulação.
Com a Pandemia, houve uma explosão na exigência por e sobre alguns profissionais. Com a superlotação de hospitais e centros de atendimento, a pressão foi enorme.
Desde Março de 2020, equipes de médicos, enfermeiros e atendentes estão sendo sobrecarregadas em plantões ininterruptos e muito pesados em todos os aspectos.
Várias reportagens vêm mostrando a dramática rotina em hospitais: médicos (e equipe) que não fazem pausas, deixando inclusive de comer, beber água e até ir ao banheiro por senso de urgência das demandas e para não correr o risco de se contaminar ao fazer qualquer movimento em falso.
Espelhos foram colocados nestas salas onde as equipes vestiam e depois tiravam os EPIs (Equipamento de Proteção Individual). Deveriam fazer isto se olhando no espelho para não retirá-los de maneira errada e se contaminar. Na exaustão ao final de um plantão cansativo, dramático e interminável, é instintivo querer arrancar aquela roupa rapidamente.
Ouvimos depoimentos de membros destas equipes que trabalhavam por horas dobradas usando, eles mesmos, fraldões para não ter que tirar todo aquele equipamento para ir ao banheiro.
Quantos profissionais viram pacientes agonizando, morrendo? Tratamentos sem melhora? Familiares desesperados em busca de notícias? Ter que escolher a quem atender primeiro?
Médicos intensivistas relatando atendimento a 25 pacientes ao mesmo tempo em vez de 10 (média usual)?
Quantos profissionais deixaram de voltar para casa com medo de contaminar a família?
Quantos deles se viram doentes na sequência?
Impossível não associar tais situações à cenários de guerra, devastadores e traumáticos.
Vimos alguns relatos de profissionais que, no meio de plantões, se uniam em correntes de orações, se ajoelhavam e rezavam. Profissionais que tiveram crises de ansiedade, de desespero; arrancaram a roupa e foram embora, como se estivessem em um transe.
Quanta pressão e demandas físicas e emocionais um ser humano suporta sem “quebrar”?
Estamos vivendo e acompanhando as oscilações no contágio, número de casos e gravidade. Melhora e piora. Fechamento e abertura. E isto traz tensão, medo e instabilidade à todos, mas para quem trabalha com saúde o reflexo é muito mais direto, intenso e ininterrupto.
Após tanto tempo seguido sob pressão; expostos e vulneráveis, é imperativo que, se antecipe o possível risco de Burnout, implementando mudanças que possam prevenir e contrabalançar tamanho esgotamento.
Gestores de hospitais, diretores, responsáveis pela organização e logística destes tipos de trabalho precisam levar em conta a sobrecarga sobre os funcionários. E os próprios profissionais necessitam de equilíbrio e atenção ao seu próprio estado.
É muito difícil pensar nisto quando se está no olho do furacão, quando há vidas dependendo da sua atuação, em situações extremas.
São justamente estas que demandam níveis basais de boa saúde física e mental; que os envolvidos nestas funções possam ter boas condições de trabalho, acolhimento em suas famílias e relacionamentos e suas necessidades atendidas.
O cuidado de quem trata e atende; reconhecimento, valorização e eterna gratidão aos que cuidam das necessidades e demandas mais importantes e vitais para todos nós.