Serenidade, trabalho e 4 kilos a mais.

(De: Saúde mental na pandemia – 72)

Há alguns anos, alguém muito gentil me disse algo assim: “Se você estiver no meio de uma correnteza no mar, não fique fazendo força para tentar sair, pois vai se exaurir e ainda continuará ali…Melhor boiar um pouco e depois sair com calma.”

De fato, quando o entorno é muito, muito mais forte que nós, precisamos poupar energia para ações possíveis e eficientes.

• Serenidade

Aceitar o que não posso mudar, coragem para modificar aquilo que está em meu controle e sabedoria para distinguir um do outro.

A chamada “Oração da Serenidade” é repetida constantemente em grupos como AA, NA (alcoólicos e narcóticos anônimos) e outros tantos onde indivíduos com problemas de dependência- de álcool, drogas, jogo, sexo, e certas compulsões, se reúnem para acolhimento, ajuda e compartilhamento.

Fomos apanhados de surpresa pela pandemia mundo afora. Além dos casos graves e letais da doença, não foi possível prever tantas sequelas, tempo de duração e consequências na saúde física, mental, econômica, social e educacional.

Passamos por grandes aflições e incertezas: Qual será a magnitude em nosso país tão desigual, discrepante e despreparado? Por quanto tempo? Como acontecerá?

Também tivemos medo e projetamos imagens apocalípticas em função da realidade em nosso país: pobreza, baixo saneamento, falta de projetos sociais mais abrangentes e os anos necessários para que surgissem vacinas.

E então elas vieram pelas mãos dos nossos super heróis: médicos, cientistas, pesquisadores. Grande alívio e esperança !

Agora estamos no momento de resultados positivos e concretos: vacinas que protegem, uso de máscara como barreira imprescindível, entendimento da necessidade de distanciamento social, restrições e higienização. Maior conhecimento da infecção e tratamentos mais eficazes.

Mas, também junto com isto, surgem novas cepas ainda pouco conhecidas e ameaçadoras…

Ficamos mais positivos quanto ao futuro e aliviados por ter maior conhecimento e experiência, o que é espetacular em tão pouco tempo. Porém isto não aplaca necessariamente todas as nossas angústias porque ainda há um longo caminho a percorrer.

Não podemos mudar os fatos com as próprias mãos, decisões ou decretos mas, sendo impossível, também não vamos nos “enterrar” debaixo das cobertas e não fazer nada até passar.

Então vamos avaliar com tranquilidade, empatia e racionalidade o que podemos fazer para mitigar o sofrimento- o nosso e o alheio.

• Trabalho (duro)

Tudo dá trabalho. Cuidar da saúde, de quem se ama, ter amigos, fazer uma carreira, ganhar dinheiro. Para ter (e também manter tudo isto) é necessário se esforçar.

Até para ser feliz, precisamos de algum empenho.

Seu corpo não pede sol, atividade física, nem alface. Necessita, mas não solicita. Ele- o seu, o meu e o dos outros, quer sofá, diversão e comida calórica, e isto não significa indolência ou patologia, mas somente instinto de preservação; nosso corpo e metabolismo trabalham para gastar o mínimo de energia, e assim garantir a manutenção. Isto faz parte de nosso mecanismo primitivo.

Portanto, na maioria dos casos, fazemos o que precisa ou deve ser feito- isto é, praticamente tudo- a partir de decisões racionais e movimentos proativos que as acompanham.

Ou seja: se trata de intenção, esforço e ação, deixando de lado arroubos inspiracionais como “motivação” e afins. Estes são ótimos para vender livros. Ponto.

Primeiramente vem o seu bem estar, pois já ficou claro que para cuidar de outros e ajudar, você precisa estar em boas condições.

Seja qual for a sua realidade, há sempre a possibilidade de se passar melhor ou pior e isto depende muito de quanto você investe na sua própria saúde e do empenho para ter melhores condições no dia a dia.

Isto implica em, além de suas obrigações de trabalho, familiares e domésticas, reservar tempo e atenção ao seu próprio lazer e fruição. Precisamos muito de distração e alegrias- são nossos carregadores de baterias para seguir nos trilhos. Cuide-se bem e o seu cuidado com os outros será mais fácil e eficiente.

E com relação aos outros: Você possui uma boa condição financeira? Poder de mobilização? Conhecimento? Habilidades? Tempo? Vontade? Use-os para ajudar !

Grandes empresários podem doar milhões em dinheiro e ceder suas estruturas a para logística necessária. Profissionais de todas as áreas contribuem com seus conhecimentos e tempo para ajudar. Você pode ajudar seus familiares e amigos. O jovem que se oferece para ir ao supermercado fazer as compras para o vizinho idoso. Todos podem e devem colaborar como e quando tiverem condições, mantendo ao mesmo tempo, o auto cuidado e bem estar.

Além do trabalho formal e obrigatório para a subsistência, ainda tivemos o acréscimo das atividades domésticas, ajuda escolar aos filhos, auxílio à parentes em vulnerabilidade. E, somado a isto, nosso ímpeto e urgência de ajudar ao próximo.

Muitos profissionais de saúde ampliaram seus atendimentos voluntários, sociais. Doaram tempo e conhecimento para ajudar, acolher e orientar os mais necessitados e isto foi uma grande ajuda para muita gente, fazendo jus ao princípio primeiro de qualquer profissional desta área, que é a defesa e promoção da saúde, trabalhando duro e de forma abnegada para todos avançarmos melhor e juntos.

Muito trabalho, empenho, dedicação e empatia que valem cada passo do caminho.

 

• 4 kilos a mais

Antes de mais nada, aqui abordamos o ganho ou perda de peso dentro de parâmetros de normalidade e de conexão com o momento presente e não como problemas mais complexos.

Existem, contudo, os chamados Transtornos alimentares que necessitam de atendimento especializado e não se encaixam nas alterações corriqueiras.

Por responsabilidade profissional e pessoal, repito aqui que tanto o diagnóstico quanto o tratamento de Transtornos Alimentares devem ser feitos por profissionais especializados.

Dito isso, em determinadas situações as flutuações de peso são pontuais, portanto mais facilmente administráveis.

Os kilos vem e vão.

Hoje ganhamos um tanto mais. Amanhã, um tanto menos. E, em determinados momentos de nossas vidas, podemos até chegar mais perto de exageros para cima ou para baixo, sem configurar um transtorno.

Ao longo deste ano e quase 7 meses de tantas alterações e instabilidades, a maioria de nós ganhou peso. E houve uns poucos (bem poucos, de fato), que até perderam, mas foram casos mais raros.

A combinação de: ambiente externo ameaçador, limitado, ansiedades, restrições de mobilidade (extremamente angustiante para alguns) e pouca movimentação física causaram aumento de peso. Em publicação recente no jornal, se apontava para uma média entre 6 e 7 kilos, sendo que no Brasil, ficamos em 6,5k.

Queremos “comfort food” : bolo, biscoito, frituras. Nunca chá, chuchu ou rúcula. (Ainda não me ouvi nenhum relato de episódio compulsivo por alface…)

Tudo isto para dizer que: dentro desta realidade de pandemia, medo, indefinições e restrições, é natural que alguns de nós tenhamos ganho peso. E isto aconteceu em um ano e meio aproximadamente.

Não foi do dia para a noite que se ganhou peso, então também se perderá devagar. Sem tanta pressa ou ansiedade.

Ganhamos peso sim, e podemos equilibrar isto melhor a partir de estratégias e planejamento para ir perdendo- caso seja necessário ou desejado- indo devagar, com bom senso, dedicação e, principalmente, calma.

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