(De: Saúde mental na pandemia – 70)
“Não saberia descrever. Varia muito e rapidamente. Sinto tristeza e angústia pela situação, alegria por estar viva e gratidão. Reconhecimento tanto da minha sorte, quanto da injustiça com tantos outros.”
“Me sinto profundamente conectada com todos os seres humanos, e também desconectada de todos- quero me isolar e não ter que falar com ninguém.”
“Compreendo aqueles que precisam sair para ver gente, pois já estão em extremo desânimo e desespero, e tenho muita raiva de quem faz isso: me parece uma indiferença e egoísmo prejudiciais aos demais”.
Me sinto inadequada quando quero fugir de celebrações por Zoom e, às vezes, ultra carente quando recebo poucas mensagens por Whatsapp- será que ninguém quer mais saber de mim???”
Ódio, empatia, entusiasmo, apatia, interesse, falta (física, emocional e afetiva), saudade, hostilidade, esperança, orgulho, ansiedade, frustração, aversão, compaixão.
Não estamos loucos. Estamos oscilantes. Instáveis. Voláteis e voluveis. Emoções, sentimentos e pensamentos que vão se moldando de acordo com o momento que estamos vivendo e também os moldam reciprocamente.
Experiências intensas e mutantes: ontem de um jeito, hoje de outro, e amanhã…quem sabe??
Dito de maneira básica, emoções são respostas químicas e neurais que surgem de um estímulo ambiental ao cérebro, acionando nossa fisiologia e comportamentos.
E os sentimentos são respostas às emoções: como cada indivíduo se sente diante daquela emoção; estados e reações que expressamos quando vivenciamos os acontecimentos.
Ambos estão fortemente conectados, sendo as emoções frequentemente mais rápidas, automaticas e claras: temos medo, por exemplo, quando alguém está descontrolado e nos ameaçando.
Já os sentimentos podem ser complexos, subjetivos e eventualmente mais duradouros.
Novamente, a definição e diagnóstico de transtornos psíquicos ou psiquiátricos, precisa estar conectada à realidade concreta- fatos, números e constância dos sintomas. Se tudo está como sempre e não há nenhuma alteração em especial, mas nos sentimos estranhos, desanimados ou instáveis, isto faz pensar em questões mais individuais que merecem especial atenção.
Entretanto, se o ambiente externo se encontra concretamente muito diferente, confuso, indefinido, ameaçador, ansiogênico e nos sentimos alterados, isto faz sentido.
Acompanhando a Pandemia mundo afora: altas, arrefecimento, vacinas, flexibilização, volta ao normal. (“Novo normal” - Aaaarg!)
Abriu. Fechou.
Melhorou. Piorou.
Sabemos mais. Não temos ideia.
Vacinas eficientes. Novas variantes.
Podemos pensar em definições mais compassivas, simpáticas e com um toque de bom humor. Sugiro nova nomenclatura: “Estado multipolar normal de rápida e imprevisível ciclagem, variando de acordo com a interação com a realidade externa, em constante diálogo com nossas próprias e peculiares vulnerabilidades”. (Brincadeira, claro ! Só para não patologizar nem normalizar o anormal, já que é a realidade que temos para hoje…)
Sabendo que estamos passando por longo e incerto período onde, cada descoberta, estudo e estatística nos lança em novas perspectivas e possibilidades, precisamos entender que, todavia sabemos pouco, e que também tudo está mudando.
Como na linda música de Lulu Santos, composta muitos anos antes desta situação , e mais atual que nunca:
“Tudo muda o tempo todo, no mundo…”
Reagir- física e emocionalmente à realidade que objetivamente acontece e se desenvolve. Acolher estados e sentimentos variados e variantes. Oscilar e vergar. Esta é a melhor opção para lidar com tamanhos desafios. Assim ficamos em sintonia e mais bem preparados para o que virá.